Falcão e o Soldado Invernal - Uma Análise da Série


"Símbolos não são nada sem os homens e mulheres que os deram valor"

 Qual é o peso de um símbolo? Quão forte tem que ser uma pessoa para conseguir substituir aquele que é a maior inspiração para as pessoas, civis e heróis? Mesmo que não sejam verbalizadas essas perguntas são a força motriz da trama de Falcão e o Soldado Invernal. A história começa nos apresentando Sam Wilson em combate, mesmo que nada de novo seja mostrado aqui, a coreografia das lutas, assim como os efeitos ao vermos o voo do Falcão, suas manobras, uso de armas e de tecnologias é fluido e agradável de se ver.

Também vemos outra faceta de Sam, sua dúvida, seu medo em relação ao peso que ele é pode ter que carregar, e assim o vemos desistindo do seu direito ao famoso Escudo do Capitão América, entregando-o para o governo americano, com o intuito de preservá-lo em um museu

Do outro lado dessa história também acompanhamos Buck Barnes, o Soldado Invernal, a história nos mostra um outro lado de Buck, um lado que ele reprime e mente para sua terapeuta, mas que ele não consegue esconder de si mesmo, seus medos e anseios se manifestam em pesadelos, lembranças de quem ele já foi e do que costumava ser. Vemos seu desconforto com o mundo moderno, sendo um homem deslocado no tempo, pois não possui pares iguais a ele



Em um primeiro  episódio eficiente a série nos reapresenta seus personagens, de forma intima, vemos ali mais do que os uniformes e armaduras, vemos pessoas com medo, medo de suas ações, medo dos símbolos que os cercam, e também vemos decepção. Seja a decepção de Sam ao ver sua família passando necessidade e ele não poder fazer nada, seja a decepção de Barnes quando o governo anuncia o novo Capitão América, John Walker.

Também somos apresentados aos Apátridas, um grupo misterioso que tem por objetivo acabar com as nações e formar um único povo. Para eles, as fronteiras e o sentimento nacionalista impedem a fraternidade entre os povos e criam barreiras entre pessoas iguais, separadas por linhas imaginárias e relações de poder arbitrárias. Nesse sentido, o ideal dos Apátridas é oposto à própria ideia do Capitão América. Eles condenam o nacionalismo pois ele dividiria a humanidade, faria as pessoas odiarem seus iguais e seriam a causa das guerras (a própria imagem do Capitão América traz a ideia do nacionalismo estadunidense no contexto da Segunda Guerra). O ideal dos Apátridas também nega o fascismo, que é o mais alto nível de exaltação do nacionalismo e exclusão de outros povos. Suas convicções parecem nobres, contudo os Apátridas agem de modo agressivo e ignoram totalmente a identificação dos povos por suas histórias e costumes, que não precisa necessariamente significar a falta de fraternidade e empatia por outros povos.

E assim, quando todas as peças do tabuleiro estão dispostas a história segue seu caminho, sempre mantendo lutas muito bem coreografadas, diálogos que fluem de maneira natural e espontânea, a caminhada de Sam e Buck vai sendo sedimentada. Sem perder a essência das próprias histórias vemos as críticas ao racismo, a dura realidade de que mesmo sendo um vingador, um herói, Sam ainda é descriminado pela cor da pele. E o ápice  desses momentos se dá quando nossa dupla de protagonistas encontra Isaiah Bradley.

Com suas aparições na série sendo extremamente marcantes, vemos na imagem de Isaiah um homem quebrado, quebrado pelo povo que tentou proteger, vemos nele uma dor tão gritante que se torna impossível não senti-la. Os fatos sobre sua vida, sobre quem ele foi e o que fez, nunca nos são revelados por completo, mas apenas o que nos é dado é suficiente para sabermos, para entendermos como ele se sente. 



E se estamos aqui elogiando o personagem, precisamos elogiar Carl Lumbly, que dá vida a esse personagem de maneira marcante, nos fazendo querer saber mais sobre seus feitos e sua vida. Nesse sentido, convém elogiar mais dois personagens, ambos tendo papel de antagonista em algum momento da série, aqui falamos da ascensão e queda de Walker e também da profundidade alcançada pelo agora denominado Barão Zemo.


Walker era o candidato ideal para ser o soldado que representava o governo, mas uma escolha duvidosa para carregar o manto do Capitão América, no momento em que ele ganha mais destaque, no segundo episódio,  já começamos a perceber algumas coisas a seu  respeito, a primeira delas é o temperamento explosivo, as atitudes impulsivas e impensadas que se somam ao seu orgulho. O orgulho de ser quem é, de estar ali  segurando aquele escudo e com a progressão da série percebe-se o quão perigoso Walker pode ser para ele e para todos ao seu redor.

A série faz muito bem em trabalhar sua frustração com a rejeição que ele sofre, as pessoas não o veem como um símbolo, Sam e Buck não o querem como companheiro, mesmo assim ele sente a vontade de fazer alguma coisa, de mudar, mas a cada erro, a cada fracasso percebemos que esse homem sorridente esconde dentro de si, algo muito pior, que à medida em que a situação vai se complicando ele vai agindo de forma cada vez mais violenta, sendo cada vez mais autoritário.

Se Walker é o homem que começa transparente em seus sentimentos, em sua raiva e em sua angustia, aqui vemos, o finalmente nomeado, Barão Zemo como sua contraparte. Daniel Brühl monta seu personagem com sutilezas, nos criando a sensação de que ele sempre vai criar o caos, mas isso não importa, uma vez que o magnetismo do ator nos prende em relação ao personagem e quando nos damos conta, queremos mais. Assim, construindo a tensão e quebrando a todo instante ele vai se inserindo na trama, se tornando essencial a sua realização, ou pelo menos é o que quer que todos pensem.

Então o que podemos falar da série como um todo? Não chega a ser perfeita, o começo lento apesar de bem montado, poderia ter estabelecido algumas relações de formas mais ágeis, assim os dois primeiros episódio servem para nos apresentar a trama e qual será o papel de cada personagem nela, quando a série avança pro seu segundo terço temos ai uma mudança de ritmo, muito bem vinda, que também começa a criar uma tensão  entre os personagens, tudo torna-se imprevisível.

Justamente nesse ponto a história brilha, ao nos mostrar participações mais do que especiais das Dora Milage e da agente Carter - presente na história por pouco tempo, mas o suficiente para ser lembrada e também para deixar na cabeça de todos uma pergunta fundamental quanto ao futuro que esta sendo construído no universo Marvel. Enquanto aqui as Dora nos conduzem pelo ápice da história, seu momento de clímax, que se inicia no terceiro episódio, estoura no quarto e por fim se acalma no quinto, sendo esse uma preparação para o derradeiro final da série que nada mais é do que o fechar das pontas que precisavam ser fechadas e nos mostrar que muito ainda se espera.

Assim, com uma dupla cativante em sua relação disfuncional, Falcão e o Soldado Invernal trás mudanças para o mundo Marvel, apresenta novas personas que vieram para impactar esse mundo e por fim muda o status de personagens antigos aumentando suas importâncias dentro desse mundo. Seguindo o tom ditado pelas próprias HQs do Falcão Capitão América, lançadas em 2015, que tem como base os debates sociais, especialmente relacionado aos imigrantes e ao tratamento que o governo dava a eles, vemos grandes momentos de Sam que inspira os outros ao seu redor por se manter firme em suas crenças, por acreditar na mudança e que as coisas podem ser feitas.

Se querem o veredito, estamos diante de uma série cativante e muito eficiente em contar sua história, coreografias muito bem trabalhadas e lutas diversificadas, o muito criticado humor da Marvel continua presente e se encaixa perfeitamente na série, assim como os filtros mais claros, a maior parte das ações acontecendo a luz do dia, nos passa uma sensação de realidade. Muitas discussões pertinentes podem ser retiradas, além é claro das referências que são jogados em nós enquanto a trama avança. Por fim, termino indicando essa série a todos, ela não se propõe a ser inovadora como foi WandaVision, ela tem sua própria estética e proposta e se sai muito bem assim, uma excelente série de ação, que nos mostra a ascensão do novo Capitão América.


Ps - Gostaria de deixar meus agradecimentos a página Filosofia de Personagens, que me deu a permissão para utilizar um de  seus textos para estar elaborando essa crítica. Então fica a minha recomendação para os que se interessarem.



Referência

PERSONAGENS, Filosofia de. Os Apátridas estão certos? 12 abr. 2021. Instagram: FilosofiadePersonagens. Disponível em: https://www.instagram.com/p/CNkdufIjK3S/. Acesso em: 23 abr. 2021.

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